"A poesia é conhecimento, salvação, poder, abandono. Operação capaz de transformar o mundo, a atividade poética é revolucionária por natureza; exercício espiritual, é um método de libertação interior. A poesia revela este mundo; cria outro. Pão dos eleitos; alimento maldito. Isola; une. Convite à viagem; regresso à terra natal. Inspiração, respiração, exercício muscular. Súplica ao vazio, diálogo com a ausência, é alimentada pelo tédio, pela angústia e pelo desespero. Oração, litania, epifania, presença. Exorcismo, conjuro, magia. Sublimação, compensação, condensação do inconsciente. Expressão histórica de raças, nações, classes. Nega a história, em seu seio resolvem-se todos os conflitos objetivos e o homem adquire, afinal, a consciência de ser algo mais que passagem. Experiência, sentimento, emoção, intuição, pensamento não dirigido. Filha do acaso; fruto do cálculo. Arte de falar em forma superior; linguagem primitiva. Obediência às regras; criação de outras. Imitação dos antigos, cópia do real, cópia de uma cópia da Ideia. Loucura, êxtase, logos. Regresso à infância, coito, nostalgia do paraiso, do inferno, do limbo. Jogo, trabalho, atividade ascética. Confissão. Experiência inata. Visão, música, símbolo. Analogia: o poema é um caracol onde ressoa a música do mundo, e métricas e rimas são apenas correspondências, ecos, da harmonia universal. Ensinamento, moral, exemplo, revelação, dança, diálogo, monólogo. Voz do povo, língua dos escolhidos, palavra do solitário. Pura e impura, sagrada e maldita, popular e minoritária, coletiva e pessoal, nua e vestida, falada, pintada, escrita, ostenta todas as faces, embora exista quem afirme que não tem nenhuma: o poema é uma máscara que oculta o vazio, bela prova da supérflua grandeza de toda obra humana!" Octavio Paz


sábado, 22 de dezembro de 2012

Inspiração... Loucos e santos



Escolho meus amigos não pela pele ou outro arquétipo qualquer, mas pela pupila.
Tem que ter brilho questionador e tonalidade inquietante.
A mim não interessam os bons de espírito nem os maus de hábitos.
Fico com aqueles que fazem de mim louco e santo.
Deles não quero resposta, quero meu avesso.
Que me tragam dúvidas e angústias e aguentem o que há de pior em mim.
Para isso, só sendo louco.
Quero os santos, para que não duvidem das diferenças e peçam perdão pelas injustiças.
Escolho meus amigos pela alma lavada e pela cara exposta.
Não quero só o ombro e o colo, quero também sua maior alegria.
Amigo que não ri junto, não sabe sofrer junto.
Meus amigos são todos assim: metade bobeira, metade seriedade.
Não quero risos previsíveis, nem choros piedosos.
Quero amigos sérios, daqueles que fazem da realidade sua fonte de aprendizagem, mas lutam para que a fantasia não desapareça.
Não quero amigos adultos nem chatos.
Quero-os metade infância e outra metade velhice!
Crianças, para que não esqueçam o valor do vento no rosto; e velhos, para que nunca tenham pressa.
Tenho amigos para saber quem eu sou.
Pois os vendo loucos e santos, bobos e sérios, crianças e velhos, nunca me esquecerei de que a "normalidade" é uma ilusão imbecil e estéril.
Oscar Wilde

quarta-feira, 19 de dezembro de 2012

Inspiração... Ave de Prata



Ave de Prata
Zé Ramalho

É muito mais do que muito
Muito mais do que quantos anos todos piorei
É muito mais do que mata
Muito mais do que morrem todos pela planta do pé
É muito mais do que fera
Mais do que bicho quando quer procriar
Uma espécie, sementes da água, mistérios da luz
É muito mais do que antes
Mais do que vinte anos multiplicar
Dividir a mentira
Entre cabelos, olhos e furacões
Inventar objetos
Pela esfinge quando era mulher
Ave de prata
Veneno de fogo
Vaga-lume do mar
O mar que se acaba na areia
Gemidos da terra apoiados no chão
Entre todos que usam os dentes do arpão
Apoiados em cada parede pela mão
Pela mão que criou tantas trevas e luz
e cada coisa perdida
Perdidamente pode se apaixonar
Pela última vida
Poucos amigos hão de te procurar
Como é o silêncio?
E nesse momento, tudo deve calar
numa história que venha do povo
O juízo final

domingo, 16 de dezembro de 2012

Inspiração... Sobre leis e homens de balanças


Venham leis e homens de balanças, mandamentos daquém e dalém mundo.Venham ordens, decretos e vinganças, desça o juiz em nós até ao fundo. Nos cruzamentos da cidade, brilhe, vermelha, a luz inquisidora. Risquem no chão os dentes da vaidade e mandem que os lavemos à vassoura. A quantas mãos existam, peçam dedos para sujar nas fichas dos arquivos. Não respeitem mistérios, nem segredos, pois que é natural nos homens serem esquivos. Ponham livros de ponto em toda a parte, relógios a marcar a hora exata. Não aceitem outra arte, que não sejam inquérito, local e data. Mas quando nos julgarem bem seguros, cercados de bastões e fortalezas, hão de cair em estrondo os altos muros. E chegará o dia das surpresas.
José Saramago

http://tvcultura.cmais.com.br/provocacoes/pgm-596-venham-leis-e-homens-de-balancas-11-12-2012


domingo, 9 de dezembro de 2012

Sonhadora!




Sonhos são asas
frágeis,
coloridas,
brilhantes.
Voam leves,
espalham beleza.
Sonhos são atemporais:
desconhecem a eternidade e o instante.
Sonhar é como mergulhar num oceano,
caminhar numa praia deserta,
lançar-se num abismo,
navegar em mar aberto,
viajar pelo espaço como uma estrela errante.
Para quê servem os sonhos?
Muitos são os que dizem que acreditam em seus sonhos,
Eu não acredito nesses
porque sonho não é crença.
Mas creio naqueles que vivem seus sonhos,
porque sonhar é um jeito de ser,
de se fazer acontecer como manifestação singular da vida.
Sonho é aquilo que nos move.
Sonho é movimento que muda a realidade...
Sonho é também realidade.
Inexistente.
Esperança.
Loucura.
Utopia.
Razão para viver.
Leila