"A poesia é conhecimento, salvação, poder, abandono. Operação capaz de transformar o mundo, a atividade poética é revolucionária por natureza; exercício espiritual, é um método de libertação interior. A poesia revela este mundo; cria outro. Pão dos eleitos; alimento maldito. Isola; une. Convite à viagem; regresso à terra natal. Inspiração, respiração, exercício muscular. Súplica ao vazio, diálogo com a ausência, é alimentada pelo tédio, pela angústia e pelo desespero. Oração, litania, epifania, presença. Exorcismo, conjuro, magia. Sublimação, compensação, condensação do inconsciente. Expressão histórica de raças, nações, classes. Nega a história, em seu seio resolvem-se todos os conflitos objetivos e o homem adquire, afinal, a consciência de ser algo mais que passagem. Experiência, sentimento, emoção, intuição, pensamento não dirigido. Filha do acaso; fruto do cálculo. Arte de falar em forma superior; linguagem primitiva. Obediência às regras; criação de outras. Imitação dos antigos, cópia do real, cópia de uma cópia da Ideia. Loucura, êxtase, logos. Regresso à infância, coito, nostalgia do paraiso, do inferno, do limbo. Jogo, trabalho, atividade ascética. Confissão. Experiência inata. Visão, música, símbolo. Analogia: o poema é um caracol onde ressoa a música do mundo, e métricas e rimas são apenas correspondências, ecos, da harmonia universal. Ensinamento, moral, exemplo, revelação, dança, diálogo, monólogo. Voz do povo, língua dos escolhidos, palavra do solitário. Pura e impura, sagrada e maldita, popular e minoritária, coletiva e pessoal, nua e vestida, falada, pintada, escrita, ostenta todas as faces, embora exista quem afirme que não tem nenhuma: o poema é uma máscara que oculta o vazio, bela prova da supérflua grandeza de toda obra humana!" Octavio Paz


quarta-feira, 30 de janeiro de 2013

Inspiração... [das Elegias de Duíno]



Tu, quer a transformação. Oh deixa arrebatar-te pela chama
em que algo se te escapa que se ufana de metamorfoses;
aquele Espírito criador, que domina o que é terreno,
não ama, no lanço da figura, nada tanto como o ponto giratório.

O que se fecha na mobilidade, é já inteiriçado;
supõe-se acaso seguro na proteção do pardacento ensosso?
Espera, o mais duro adverte de longe o que é duro.
Ai: o martelo ausente ergue-se para o golpe.

Quem como fonte transborda, o conhecimento o conhece;
e conduzi-lo em êxtase através da Criação serena
que como princípio muitas vezes acaba e com o fim principia.

Todo espaço feliz é filho ou neto da separação,
que eles percorrem, em espanto. E a Dafne transformada,
desde que sente como loureiro, quer que te mudes em vento.

Rainer Maria Rilke

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