"A poesia é conhecimento, salvação, poder, abandono. Operação capaz de transformar o mundo, a atividade poética é revolucionária por natureza; exercício espiritual, é um método de libertação interior. A poesia revela este mundo; cria outro. Pão dos eleitos; alimento maldito. Isola; une. Convite à viagem; regresso à terra natal. Inspiração, respiração, exercício muscular. Súplica ao vazio, diálogo com a ausência, é alimentada pelo tédio, pela angústia e pelo desespero. Oração, litania, epifania, presença. Exorcismo, conjuro, magia. Sublimação, compensação, condensação do inconsciente. Expressão histórica de raças, nações, classes. Nega a história, em seu seio resolvem-se todos os conflitos objetivos e o homem adquire, afinal, a consciência de ser algo mais que passagem. Experiência, sentimento, emoção, intuição, pensamento não dirigido. Filha do acaso; fruto do cálculo. Arte de falar em forma superior; linguagem primitiva. Obediência às regras; criação de outras. Imitação dos antigos, cópia do real, cópia de uma cópia da Ideia. Loucura, êxtase, logos. Regresso à infância, coito, nostalgia do paraiso, do inferno, do limbo. Jogo, trabalho, atividade ascética. Confissão. Experiência inata. Visão, música, símbolo. Analogia: o poema é um caracol onde ressoa a música do mundo, e métricas e rimas são apenas correspondências, ecos, da harmonia universal. Ensinamento, moral, exemplo, revelação, dança, diálogo, monólogo. Voz do povo, língua dos escolhidos, palavra do solitário. Pura e impura, sagrada e maldita, popular e minoritária, coletiva e pessoal, nua e vestida, falada, pintada, escrita, ostenta todas as faces, embora exista quem afirme que não tem nenhuma: o poema é uma máscara que oculta o vazio, bela prova da supérflua grandeza de toda obra humana!" Octavio Paz


sexta-feira, 23 de novembro de 2012

1º de agosto

A Espera - Babinski (acrílica sobre tela)

Não! Não foi neste dia...
na fria manhã de inverno,
quando regressei das terras do sul,
e ouvi melodiosas vozes
que, atrevidas, saiam
da parda folha, cor da estação anterior,
impregnada com um perfume amadeirado,
adornada com um Babinski,
obra sua, para me impressionar!
Também não foi naquele janeiro,
que entre taças de vinho 
e um sonho de verão,
nos amamos no alto de uma torre.
Não, não foram nesses dias...
Ah! Mas ainda teve aquela tarde de sábado 
cinzento, de um certo mês,
de mil novecentos e noventa e tal
quando houve o tal furto,
Teus amigos me contaram que,
enquanto você me esperava, 
alguém levou teu fusca branco,
sem seguro,
com tuas frutas e teu livro predileto
e fizeram questão de observar o quanto você se arriscava!
Não, não foi nesse dia...
Sabe aquela noite em que te liguei
só porque a cálida luz da lua azul
fazia desabrochar as flores de maio,
e fiz você ser testemunha?
Até achei que esse fosse o dia,
mas não era!
Por muito tempo, pensei que
tivesse sido em cada um dos dias em que te ver 
sempre era uma primeira vez:
eu, a alguns passos de casa e você,
no portão;
eu, no alto de um mirante e,
você, sobre a ponte, alimentando as carpas;
eu, divagando sobre trilhos e,
você, saltando de paraquedas;
eu, abrindo uma trilha e,
você, enfrentando a correnteza;
eu, bordando o céu com estrelas e,
você, desenhando nas nuvens;
eu, brincando com fogo e,
você, ensaiando o voo!
Na ânsia de saber esse dia,
investi em outros caminhos
até então inexplorados:
do sonho, da adivinhação, 
da clarividência...
Já tinha ouvido falar, dos mais místicos,
que se soubesse o número do destino
teria, então, muitas revelações!
Para isso, bastava fazer a pergunta certa!
Qual?
Havia uma, que me pareceu bastante apropriada:
- Há quanto tempo existimos um para o outro?
Sou do mês de maio,
e você, de fevereiro...
nossa diferença é de...
Nove meses! O tempo de uma gestação.
Nove. 
Seria esse o nosso número?
E, nove explica o que mais?
Não explica!
porque, como dois, concebemos um existir,
o que nos tornamos.
Em sua totalidade,
porque existimos e, ainda assim, não existimos:
Fomos, somos e ainda seremos um para o outro!
O tempo... esse simplesmente é!
Em que dia mesmo você se tornou para mim
apenas uma possibilidade?
Leila

Nenhum comentário:

Postar um comentário